terça-feira, 27 de outubro de 2009

Mídia comanda campanha contra cotas

Publicado na Afropress


Pesquisas feitas entre os anos de 2001 e 2009 apontam que o Jornal O Globo – da família Roberto Marinho e que tem como diretor da Central Globo de Jornalismo, Ali Kamel, um dos líderes da campanha contra cotas – foi o jornal que mais publicou textos sobre as ações afirmativas – 46% deles contra e apenas 24% a favor. O mesmo Estudo aponta que a Revista Veja teve 100% de matérias contrárias às Ações Afirmativas.


O resultado do levantamento foi apresentado por João Feres, do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ), no Seminário “Comunicação e Ação Afirmativa: o papel da mídia no debate sobre igualdade racial”, promovido esta semana (14 e 15/10) pela Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial, Comdedine, Cepir e Seppir, na Associação Brasileira de Imprensa. “A Veja escolheu um lado, o lado contra as cotas”, disse o pesquisador do IUPERJ.


A Veja e o apartheid: A revista é sócia do conglomerado de mídia que apoiou o regime racista do apartheid na África do Sul - o Grupo Naspers que, em novembro do ano passado passou a ser proprietário de 30% das ações do Grupo Abril, que edita a Revista. O negócio, estimado em US$ 422 milhões, foi o maior investimento feito pelo Grupo apoiador do apartheid no exterior. Apesar da família Civita, proprietária da Abril, permanecer no controle do Grupo Abril e da Veja, o Naspers passou a ter assento no Conselho de Administração.


O Grupo Naspers, fundado em 1.915, é uma multinacional que atua nos segmentos da mídia eletrônica e impressa. Com faturamento de US$ 2,2 bilhões, publica mais de 30 revistas e cerca de 25 jornais, dos quais o maior é o "Dayly Sun", na África do Sul. Atua em 50 países e tem negócios de Internet, TV paga e editora de livros. Foi uma das principais bases de sustentação do apartheid – regime racista sul africano – enquanto este vigorou no país.


Seminário: O evento teve mesas de debate com Muniz Sodré, Ancelmo Gois e Mírian Leitão do O Globo, o antropólogo e jornalista Kássio Motta, a diretora de redação da revista Cláudia Márcia Neder, Carlos Medeiros, da CEPIR, Rosângela Malachias do Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) e o próprio Feres do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ).


Mírian Leitão explicou que “o problema é quando a opinião sai do editorial ou artigo e vai para as matérias”, isto é, estas deixam de ser imparciais, o que acontece em vários veículos da grande imprensa. Entre as principais justificativas apresentadas pelas posições contrárias estão afirmações como a que as ações afirmativas não levam em conta o mérito, acirram o conflito racial e que não tem como dizer quem é negro no país. “Os brasileiros acreditam que discutir o racismo provoca racismo”, disse Carlos Medeiros da CEPIR. Mírian Leitão completou, “o que mais incomoda é escutar que o Brasil não é racista, pois isto impede o diálogo”.


Medeiros disse ainda que a ação afirmativa não deve se resumir a cotas e que este diálogo deve avançar. “As ações afirmativas não vão acabar com o racismo, mas vão promover igualdade de oportunidades”. Muniz Sodré acredita que por meio da aproximação o preconceito se torna menor. “É importante que o negro esteja em lugares onde barreiras históricas foram construídas, como é o caso das universidades”.


Identidade negra na mídia: Ao ser questionada sobre o fato da mulher negra ainda não se identificar e se enxergar nas páginas de uma revista como a Cláudia, Márcia Nader rebateu afirmando que quem diz isto não lê a revista.


“A mulher negra se vê sim na Cláudia, a Taís Araújo, por exemplo, já foi capa duas vezes”. Márcia defendeu a atitude “libertária” da revista, mas não soube dizer qual a média de matérias voltadas para este público, quantas capas de Cláudia já tiveram negras e nem o número de profissionais negros na redação. A jornalista reconheceu que a freqüência de negras retratadas na revista ainda é pouca, mas justificou dizendo que “a mídia é um reflexo da sociedade”.


Em contrapartida, Muniz Sodré foi um dos participantes que discordaram da afirmação e disse que a mídia cria o seu próprio público, construindo a realidade, não retratando-a. “E há uma imensa saudade da escravidão por parte da mídia brasileira”, acrescentou. Além disso, para reforçar a questão da identidade visual, o sociólogo disse que a relação de classe social, como muitos acreditam, não esgota a questão étnica. “O pobre branco já se encontra em vantagem, pois a cor se tornou objeto patrimonial”, concluiu.

domingo, 18 de outubro de 2009

Na luta contra a baixaria na TV

A Campanha “Quem Financia a Baixaria é contra a cidadania” foi criada em novembro de 2002, por iniciativa da sociedade civil e da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados. Tem por objetivo promover o respeito aos direitos humanos e à dignidade do cidadão na programação da televisão brasileira.

A Campanha é um instrumento democrático que possibilita à população participar da construção de uma televisão cidadã. Além disso, busca conscientizar os anunciantes a não veicularem seus produtos em programas que desrespeitam os direitos humanos.

O desrespeito aos Direitos Humanos pode ocorrer através de cenas e informações que ferem a dignidade da pessoa humana.

A mídia é reconhecida como um patrimônio social, vital para que o direito à livre expressão e o acesso à informação sejam exercidos. É por isso que as emissoras de televisão e de rádio atuam por meio de concessões públicas.

A concessão pública é uma autorização que o governo concede às emissoras de televisão para que ofereçam à população um serviço público de qualidade que promova o crescimento cultural dos cidadãos e ofereça alternativas na programação para o lazer e para a educação.

A legislação que orienta as emissoras de televisão ressalta a necessidade desses meios de comunicação promoverem a cultura da paz, a proteção ao meio ambiente, a tolerância e o respeito às diferenças de etnia, raça, pessoas com deficiência, cultura, gênero, orientação sexual, política e religiosa, dentre outras.

Então, participe dessa mobilização e fiscalize o que passa na sua televisão.

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E para você, qual é o programa campeão da baixaria na TV brasileira?

domingo, 11 de outubro de 2009

Sinais dos tempos

Segundo o site Comunique-se, a procura pelo curso de Jornalismo da USP diminuiu. Pela primeira vez em dez anos, menos de dois mil candidatos se inscreveram para concorrer a uma das 60 vagas oferecidas pela universidade. O fim da obrigatoriedade do diploma de jornalista para o exercício da profissão é apontado como um dos fatores que influenciaram a diminuição.


Para se ter uma idéia da queda na procura, no ano passado, o jornalismo era a terceira graduação mais procurada. Para o vestibular de 2010, caiu para o sexto lugar. É inegável que a falta de regulamentação na profissão causa um impacto negativo no número de inscritos no vestibular para jornalismo, mas existem outros aspectos que ajudam a explicar essa realidade, entre eles, a crise de credibilidade vivida pela imprensa brasileira.


Recentemente, o jornal Folha de S. Paulo publicou uma ficha criminal falsa da ministra Dilma no Dops. Na época, o veículo alegou que não poderia garantir que o documento era verdadeiro, mas tão pouco comprovar que era forjado. Ficou claro neste caso que a intenção era criar um desconforto à pré-candidata do PT à presidência.


Outro erro grave da Folha foi a capa do dia 19 de julho deste ano que trazia a manchete “Gripe suína deve atingir ao menos 35 milhões no país em dois meses”. O alarmismo irresponsável foi criticado pelo próprio ombudsman do jornal. O episódio criou um clima de pânico na sociedade e uma corrida aos hospitais.


Um dos princípios do jornalismo é escutar todos os envolvidos numa questão, mas alguns veículos agem de maneira unilateral, tomando partido para um determinado grupo. Nos últimos dias, imagens de integrantes do MST destruindo laranjais dominaram o noticiário. No entanto, nada se comentou que a posse da fazenda invadida, da empresa de sucos Cutrale, é contestada pelo movimento por ser uma área da União.


Ser jornalista ainda é o sonho de muitos jovens que acreditam na importância da profissão para o funcionamento da sociedade. Mas, a falta de regulamentação, que trouxe insegurança, aliada à crise ética que ronda a imprensa brasileira desestimula muitos vestibulandos. A queda na procura do curso de jornalismo da USP é só um sinal dessa derrocada.


O momento é de reflexão, afinal, ainda vale à pena estudar jornalismo para trabalhar na imprensa brasileira?

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Ligeiramente inspirado

Quem for ao cinema assistir Salve Geral esperando reviver o dia em que São Paulo parou vai se decepcionar muito. O novo longa de Sérgio Rezende (Zuzu Angel e Mauá) é ligeiramente inspirado em fatos reais e apenas isto. Na verdade, o filme conta a história de Lúcia (Andréa Beltrão), uma professora de piano que acaba se envolvendo numa trama perigosa para proteger seu filho.


Tudo começa quando o filho de Lúcia é preso depois de se envolver num assassinato. No presídio, o jovem entra em contato com a facção que faz alusão ao PCC (Primeiro Comando da Capital). Na tentativa de amenizar o sofrimento do jovem atrás das grades, a mãe se aproxima de Ruiva (Denise Weinberg), uma inescrupulosa advogada que é a responsável pelas operações do grupo criminoso.


Salve Geral tenta explicar os fatos que culminaram na barbárie ocorrida no fim de semana do Dia das Mães em 2006, mostrando a transferência dos líderes da facção e o assassinato do corregedor da polícia. O filme defende a polêmica tese que o governo paulista negociou com a organização criminosa para suspender os ataques ao estado. Essa idéia é negada até hoje pelos governantes da época. A história não se aprofunda nesta questão.


Mas o grande problema de Salve Geral não é a falta de verossimilhança, e sim, a mudança radical da protagonista. De uma mãe dedicada e de valores morais sólidos, ela se transforma numa importante agente da organização, iniciando até um inusitado relacionamento amoroso com um dos chefes. O longa também abusa da imaginação para retratar a central de operações da facção, controlada por um garoto que vive jogando videogame. Haja criatividade.


Como representante do Brasil na disputa de uma vaga ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, esperava-se mais de Salve Geral. A temática da violência, tão recorrente no cinema nacional, parece não animar a academia, veja os exemplos de Carandiru e Última Parada 174 . O mais frustrante é que o filme não consegue nem de longe transmitir a sensação de pânico coletivo daquele dia aterrorizante que ainda está vivo na mente dos paulistas.